Origem da Didática
Ainda que nas obras dos filósofos da antiguidade
existam referências às formas que deveriam ser seguidas no ensino na escola, com grandes
contribuições ao Desenho Curricular (currículo) como parte importante da
Didática, é com a obra "Didática Magna" do eminente checo João Amós
Comênio, que surge a Didática, como uma incipiente área de conhecimento. Não
obstante, o termo tinha sido utilizado, anteriormente, pelo alemão Wolfgang
Ratke, que foi o primeiro quem abordou as duas partes da Didática: Desenho
Curricular ou Currículo e a Dinâmica do Ensino, quando, segundo Sandino Hoff,
Universidade do Contestado, explicitou:
Em seus princípios teóricos, captados do período de
trabalho em Cöthen, Ratke fez distinção entre "ensinos" e "arte
de ensinar": os primeiros incluem conteúdos extraídos de uma totalidade
enciclopedicamente organizada de conhecimentos, e a segunda, de uma teoria que configura o
processo pedagógico.
Em outros termos, os "ensinos" são
compostos com base na estrutura global das ciências e da
filosofia; e a arte de ensinar relaciona-se com normas e métodos extraídos das
idéias de harmonia entre a fé, a natureza e as línguas. (HOFF, S. 2007, p.147)
Voltando ao assunto da origem da Didática, se tem que no
século XIX, Herbart, intentando criar todo um sistema científico da educação,
colocou a didática dentro da Pedagogia, como teoria da instrução. Pode ser que
a partir daqui, a Didática sempre seja vista como isso, uma disciplina da
Pedagogia. Outro aspecto que poderia ter influenciado sobre o assunto foi a
utilização ambígua dos termos: Educação, Instrução e Ensino, para denotar uma
mesma realidade ou fenômeno.
Já no século XX, a Didática passou por muitos
questionamentos, como também tinha acontecido, anteriormente, com a Biologia, a
Física, a Química, e outras ciências no século XIX. É importante destacar que
toda ciência, independentemente do seu objeto de estudo: seja da natureza, da
sociedade ou do pensamento, passa por esses períodos críticos, onde sua
estrutura conceitual fica comprometida e duvidosa. Ás vezes, novos
descobrimentos ou novas teorias estremecem a base ou fundamentação teórica de
uma determinada ciência. Voltando ao assunto da origem, é a partir deste século
XX, que começa o tratamento da Didática, como uma ciência particular.
Depois desses períodos de crises, a Didática dá um
salto qualitativo no seu desenvolvimento. Como ciência particular, com
autonomia científica, está neste
momento do século XXI, dando esse salto significativo com grandes aportes à
sociedade. Claro que, como toda ciência, enriqueceu seus fundamentos,
categorias, conceitos, leis, corolários e princípios a partir da contribuição
de cientistas de outras áreas de conhecimento. Mas não existem dúvidas que a
Didática já tem sua autonomia.
1. CONCEITOS DE EDUCAÇÃO, ENSINO E INSTRUÇÃO.
Uma das problemáticas neste campo de conhecimento é a ambigüidade da
terminologia. Claro que ciência não é como os neopositivistas consideraram,
"colocar na língua científica o conhecimento popular". Não obstante,
o sistema de conhecimento de qualquer ciência está determinado pelas categorias
e os termos que descrevem e fundamentam a estrutura base de seu objeto de
estudo. E tudo isso se logra com uma adequada utilização da língua científica,
em especial sua terminologia.
Uma das complexidades tanto para a Pedagogia, como
para a Didática são seus respectivos objetos de estudo, pois qualquer leigo se
acha no "direito" de "dissertar" sobre educação ou ensino.
Por exemplo. Quem fala sobre Física Quântica? Ou sobre Biologia Molecular? Não
é suficiente saber contar para ser matemático! Este fato leva a que existam
trabalhos, "resultados de pesquisas" que no conteúdo deles têm uma
mistura de conhecimentos acientíficos e anticientíficos que pouco ajudam na
prática social e no desenvolvimento destas ciências.
Um exemplo neste contexto é o posicionamento do
ilustre Jean Piaget que segundo um dos seus discípulo, Gadotti,M (1988, p. 64)
considerava que
Quando a maioria dos institutos de ciências, hoje, ainda se mantêm
fechados em pequenas capelas, fechados num linguajar hermético, Piaget sempre
concebeu o estudo científico como uma interseção de disciplinas. Não se pode
fazer Psicologia sem a física, sem a Matemática, sem as Ciências Sociais.
Aliás, o sucesso das teorias de Piaget sobre
desenvolvimento da inteligência nas crianças deve-se, em grande parte, à
rigorosa fundamentação físico-matemática e bioquímica. Ele sempre soube
escolher, nesse sentido, os melhores pesquisadores das áreas. Era um homem que
sabia ouvir.
Piaget não gostava de responder a perguntas sobre
educação. Limitava-se a dizer que não havia pesquisado esse campo do saber.
Perguntaram num programa de Radio
Suisse Romande, por que não investigara a afetividade. Respondeu que não
tinha tempo para tratar da inteligência e da afetividade ao mesmo tempo.
Preferiu optar pelo estudo da inteligência.
Já pensou que educando, aluno, estudante, discente, criança, escolar, aprendiz, são a mesma coisa? Ao
final não são sinônimos? Sim. Essas palavras são sinônimas na utilização do
dia-a-dia, mas não na língua científica, pois cada palavra mencionada expressa
um conceito distinto. No caso da Pedagogia, educando e escolar, seriam importantes termos dentro
do campo de estudo e pesquisa. Já para a Didática referiria melhor os termos de aluno, estudante e discentes, e assim por diante.
A língua científica deve ser objetiva, não deve
permitir ambigüidades. Outro exemplo poderia ser o fato que o professor não tem
"didática", o que o docente pode e deve ter é competência didática.
Quando no dia-a-dia, alguém diz: -"Esse professor tem uma boa
didática", na língua científica deve considerar-se que aquele profissional
de referência, tem domínio dos aspectos ou dimensões didáticas necessárias que
conformam essa competência.
Se importante é a adequada utilização da
terminologia de uma ciência, imagine o que acontece quando o assunto em questão
é o próprio objeto de estudo? Então, considerando que na língua científica não
se admite a sinonímia, se pode dizer, cientificamente "falando", que
educação, ensino e instrução não são sinônimos.
O que é educação?
Desde a época de Platão, o termo educação foi
centro dos debates. Para ele era dar ao corpo e a alma toda beleza e perfeição
que seja possível. Émile Durkheim a considerava a preparação para a vida. Para
Pestalozzi, a educação do ser humano deve responder às necessidades de seu
destino e ás leis de sua natureza. Para José Martí, é depositar em cada homem
toda a obra da humanidade vivida, é preparar o ser humano para a vida.
Segundo o ICCP (1988) se entende por educação o
conjunto de influências que exerce a sociedade sobre o indivíduo. Isso implica
que o ser humano se educa durante toda a vida.
A educação consiste, ante todo, em um fenômeno
social historicamente condicionado e com um marcado caráter classista. Através
da educação se garantirá a transmissão de experiências de uma geração à outra.
(ICCP, 1988, p.31)
Segundo Lênin, V (apud. ICCP, 1988), a educação é
uma categoria geral e eterna, pois é parte inerente da sociedade desde seu
surgimento. Também, a educação constitui um elo essencial no sucessivo
desenvolvimento dessa sociedade, a ponto de não conceber progresso
histórico-social sem sua presença.
Para Martins,J (1990) a educação é um processo de
ação da sociedade sobre o educando, visando entregá-lo segundo seus padrões
sociais, econômicos, políticos, e seus interesses. Reconhece-se aqui a
necessária preparação para a vida, já referida em outras definições e que só se
logra a através de convicções fortes e bem definidas de acordo com esses
padrões. Por isso é tão importante, mas que uma definição o mais precisa
possível, a caracterização deste objeto de estudo e pesquisa da Pedagogia.
Para uns, Educação é processo, para outros é
categoria, ou fenômeno social, ou preparação, ou conjunto de influências, e
muitos conceitos mais. Ainda seguindo a linha de pensamento de J. Martins, se
concorda que:
A educação tem os seguintes caracteres:
o
É fato
histórico, pois se realiza no tempo;
o
É um processo
que se preocupa com a formação do homem em sua plenitude;
o
Busca a
integração dos membros de uma sociedade ao modelo social vigente;
o
Simultaneamente,
busca a transformação da sociedade em beneficio de seus membros;
o
É um fenômeno
cultural, pois transmite a cultura de um contexto de forma global;
o
Direciona o
educando para a autoconsciência;
o
É ao mesmo
tempo, conservadora e inovadora. (MARTINS, J, 1990, p.23)
Deve-se analisar que a educação, mais que processo,
mais que conjunto de influências, e outras, é uma atividade. Como toda
atividade tem orientação, por tanto pode ser planejada. É processo, pois está
constituída por ações e operações que devem ser executadas no tempo e no espaço
concreto. É resultado que expressa ou manifesta uma cultura, como fato
sócio-histórico.
Mas, o que é educação? A definição a seguir não
pretende ser exaustiva, nem focalizada nessa palavra desde a perspectiva da
lingüística textual, onde claramente, o significado sempre estará dependendo de
seu contexto. Aqui só se esta definindo a categoria geral e eterna, como objeto
de estudo e pesquisa da Pedagogia.
Portanto, a Educação é uma atividade social,
política e econômica, que se manifesta de diversas formas e que seu sistema de
ações e operações exercem influências na formação de convicções para o
desenvolvimento humano do ser social e do ser individual.
Neste último aspecto vale destacar que o ser humano
que se pretende construir, desde a óptica como ser social deve ser
Desenvolvido simultaneamente nos planos, físico e
intelectual, que tem consciência clara de suas possibilidades e limitações. Um
homem munido de uma cultura que lhe permita conhecer, compreender e refletir
sobre o mundo. (MARTINS,J 1990, p. 22)
Isso significa que a educação pode ser direcionada,
considerando a expressão social que deve refletir na consciência de cada
pessoa. Por outro lado, se deve também trabalhar, nessas influências que exerce
a sociedade e o estado na formação humana do ser individual, onde:
O homem independente, mas não isolado, que
conhecendo suas capacidades físicas, intelectuais e emocionais, e senhor de uma
visão crítica da realidade, seja capaz de atuar de forma eficaz e eficiente
nessa realidade. (MARTINS,J 1990, p. 22)
Resumindo, a educação, como fenômeno inerente à
sociedade, é orientação, é processo e expressão de uma cultura sócio-política.
Pois como atividade, está constituída por esses aspectos. Por outro lado,
sabe-se que o ser humano se realiza culturalmente em tempo e espaço, e que a
complexidade dos fenômenos sociais e a quantidade de cultura emanada de muitas
gerações, precisam ser otimizadas no tempo. Por isso, e em busca de seu
aperfeiçoamento social e individual, surge o processo pedagógico, que não deve
confundir-se com o processo docente, com educação, ou com o processo educativo.
O processo pedagógico, como aspecto consciente
dentro do planejamento educacional, surge a partir das mudanças sofridas pela
sociedade e com o objetivo de construir determinado protótipo de ser humano.
Por isso, um dos meios importante para influir na construção desse novo ser, é
através do adequado planejamento educacional. Os programas, planos, e projetos,
resultado dessas atividades de gestão educativa, sejam introduzidos e
generalizados como forma ideal para orientar, executar e controlar o trabalho
educativo.
O que é ensino?
Antes de entrar-se na definição do objeto de estudo
e pesquisa da Didática, lembre-se das palavras de J. Martins (1990, p. 23) quando
expressou que "desde seu surgimento a palavra didática, significou a
ciência de ensinar". Pode ser questionado o termo ciência, mas a idéia
fica clara que o objeto é o ensino. Não se deve esquecer que na época que se
utiliza o termo, ciência era só as áreas de conhecimentos da natureza. O termo
"art" era utilizado para as atividades das atuais e reconhecidas
áreas das ciências sociais. Mas, então por que, ainda hoje, é questionada a
utilização do termo: ensino, substituindo-o por ensino-aprendizagem? Seria
interessante considerar a seguinte analogia que ajudará a entender o ensino,
como objeto e não o ensino como categoria, termo ou uma simples palavra.
Quando alguém denomina um homem de pai, utilizando
o termo de pai com a significação de pai biológico, é porque esse ser humano
masculino, tem, como mínimo um filho. Portanto, qualquer homem não é pai, só
aquele que gerou um descendente. Algo parecido, salvando a analogia, sucede com
a palavra ensino. Se um determinado professor realiza uma atividade que não
gere uma "aprendizagem" objetivada, essa atividade não pode ser
denominada de ensino. Por tanto, se não é lógico utilizar a palavra composta
pai-filho, para designar um ser humano masculino que gerou um descendente dele,
também é ilógico supor que a palavra composta "ensino-aprendizagem",
substitua o objeto: ensino.
Segundo Baranov, S.P. et al (1989, p. 75) o ensino
é "um processo bilateral de ensino e aprendizagem". Daí, que seja
axiomático explicitar que não existe ensino sem "aprendizagem". Seu
posicionamento sempre foi muito claro, quando estabeleciam entre ensino e
aprendizagem, uma unidade dialética.
Para Neuner, G. et al (1981, p. 254) "a linha
fundamental do processo de ensino é a transmissão e apropriação de um sólido
sistema de conhecimentos e capacidades duradouras e aplicáveis."
Destaca-se, por um lado, neste conceito a menção de "um sólido sistema de
conhecimento", e por outro lado, as "capacidades duradouras e
aplicáveis". No primeiro caso, referindo-se ao processo de instrução que
procura atingir a superação dos discentes e o segundo caso ao treinamento, como
forma de desenvolver as capacidades.
O ICCP (1988, p. 31) define "o ensino como o
processo de organização da atividade cognoscitiva" processo que se
manifesta de uma forma bilateral: a aprendizagem, como assimilação do material
estudado ou atividade do aluno, e o ensino como direção deste processo ou
atividade do professor.
Considerando estas idéias, fica claro que não é
preciso a utilização da composição léxica "ensino-aprendizagem" para
destacar a importância da "aprendizagem" neste processo, pois ela é
inerente ao ensino. A palavra aprendizagem neste contexto, não esta sendo
utilizada desde a perspectiva terminológica que distinguiria semanticamente os
termos: aprendência, aprendizado e aprendizagem.
Portanto, o ensino, como objeto de estudo e
pesquisa da Didática, é uma atividade direcionada por docentes à formação
qualificada dos discentes. Por isso, na implementação do ensino se dão a
instrução e o treinamento, como formas de manifestar-se, concretamente, este
processo na realidade objetiva.
Diferenciando Educação, de Ensino, seria
interessante refletir com as palavras de J.M. Guyau, quando diz que
"educar a um homem não é ensinar alguma coisa que não sabia, senão fazer
dele o homem que não existia." (GUYAU, J apud. ISÓIS, J. 1976, p. 14)
O que é instrução?
Este é um termo que tem sido utilizado
indistintamente para se referir ao que se define como educação, e também tem
sido empregado com a denotação dada aqui de ensino. Isso traz consigo um grande
dilema. Suma-se a essa ambigüidade do termo, o fato de erros de tradução de um
idioma a outro. Mas como o objetivo não é fazer a história das denotações desta
palavra, se passa a delimitar sua concepção neste trabalho.
Segundo Baranov, S.P. et al. (1989, p. 22) "a
instrução constitui o aspecto da educação que compreende o sistema de valores
científicos culturais, acumulados pela humanidade". Nesta perspectiva
nota-se a coincidência com o próprio termo de educação. A instrução, não é
diretamente um aspecto da educação, mas bem, deve ser considerado como um
elemento que aperfeiçoa o processo educativo, o que é diferente. A instrução
não é inerente à educação, através da instrução pode-se desenvolver a educação.
Se estes autores estiveram certos, não existiriam pessoas bem instruídas,
pessoas já formadas, más educadas. Ou também, não existiriam analfabetos, sem
alguma instrução, com uma boa educação.
É muito mais preciso, desde a óptica deste
trabalho, o conceito de instrução valorado pelos alemães Neuner, G, et al.
(1981, p. 112) enfatizando que na literatura pedagógica o conceito de instrução
se emprega, na maioria das vezes, com a significação de ministrar e assimilar
conhecimentos e habilidades, com a formação de interesses cognoscitivos e talentos,
e com a preparação para as atividades profissional.
O ICCP (1988), também valora a instrução com essa
mesma perspectiva profissionalizante quando expressa que:
O conceito expressa o resultado da assimilação de
conhecimentos, hábitos, e habilidades; se caracteriza pelo nível de
desenvolvimento do intelecto e das capacidades criadoras do homem. A instrução
pressupõe determinado nível de preparação do individuo para sua participação
numa ou outra esfera da atividade social. (ICCP, 1988, p. 32)
Portanto, a instrução não forma parte do conceito
de educação, nem existe uma denominada lei de unidade da instrução e a
educação. A instrução, como manifestação concreta do ensino, é uma ação
didática que desenvolve o intelecto e a criatividade dos seres humanos com
conhecimentos e habilidades que os prepara para desenvolver atividades
sócio-culturais.
Como se colocou na introdução deste trabalho é
possível que uma das causas pela qual a Didática seja considerada uma
disciplina da Pedagogia consiste na falsa concepção de que a educação leva
implícita dentro de si o processo de ensino. Por tanto, como se expresso
anteriormente que na língua científica não admite a sinonímia, Educação, Ensino
e Instrução designam realidades diferentes. A Educação se centra na formação do
ser humano, especificamente na construção da personalidade, enquanto o Ensino
reflete o processo de otimização da aprendizagem, a qual ajuda na formação do
ser humano, mas não o define. Já a Instrução é uma forma de manifestar se o
ensino, onde se focaliza os aspectos de conhecimentos e saberes da realidade
objetiva e subjetiva.
Já no final do século XX, a Didática passou por
muitos questionamentos: era disciplina técnica de outra ciência? Era mesmo
ciência? Quais seriam seus métodos de pesquisa? Algo parecido, também tinha
acontecido, anteriormente, com a Biologia, a Física, a Química, e outras
ciências antes do século XIX. Não era uma questão só da Didática.
O grande problema da Didática, ainda até hoje, é
estabelecer para a comunidade científica uma base teórica comum, independente
de culturas, com uma única terminologia, para evitar ambigüidades. Os erros de
tradução de um idioma para o outro, quando essas traduções são feitas por
pessoas que sabem o idioma, mas não tem um preparo científico nessa área e
muitas vezes fazem traduções compressíveis ao nível informal, mas com muita
ambigüidade na linguagem científica. A tradução do inglês para o português
poderia constituir um exemplo, dessa ambigüidade: "instruction"
traduzido com ensino, em vez de instrução. "Teaching" traduzido como
instrução. Por só mencionar poucos exemplos.
Outro problema não só da Didática, mas da
Pedagogia, é redimensionar as categorias, as leis e os princípios partindo de
suas verdadeiras essências e não através da imposição de critérios volitivos
sem fundamentação científica da realidade. Este é o caso da falsa unidade
dialética entre ensino e educação. Pois, erroneamente se quer estabelecer como
um axioma que entre ensino e educação existe uma unidade dialética. Isso quer
dizer que para que exista educação tem que existir ensino e para que exista
ensino tem que existir educação. Ou dito de outra forma, não hã ensino sem
educação, nem educação sem ensino. Aqui, cabe perguntar-nós. Existe educação
sem ensino? Existe ensino sem educação?
Você nunca conheceu alguma pessoa com alto grau de
instrução como resultado do processo de ensino, com uma ma ou péssima educação?
Conheceu já alguém sem instrução alguma, com uma adequada educação? O ensino se
concretiza através de instrução, treinamento e formação. Já o processo de
educação implica convicção e valores como parte essencial da formação da
personalidade do ser humano. O ensino instrui um sujeito, a educação forma o
ser humano: sua personalidade. Se esta fazendo estas colocações, pois é aqui
onde radica uns dos aspectos que fazem confundir Pedagogia e Didática e com
isto o desenvolvimento das duas ciências.
Voltando ao assunto da origem, é a partir desse
século XX, que começa o tratamento da Didática, como uma ciência particular.
Depois de períodos de crises, a Didática dá um salto qualitativo no seu
desenvolvimento. Como ciência particular, com autonomia científica, está neste
momento do século XXI, dando esse salto significativo com grandes aportes à
sociedade.
Claro que, como toda ciência, enriqueceu seus
fundamentos, categorias, conceitos, leis, corolários e princípios a partir da
contribuição de cientistas de outras áreas de conhecimento. Mas não existem
dúvidas que a Didática já tem sua autonomia.
A Didática, como acontece com qualquer outra
ciência social, reflete nas suas teorias as principais tendências, correntes e
enfoques da época que se estuda, e como já foi colocado com a contribuição de
outras ciências a fins. È por isso que em algum momento se evidencia, na base
estrutural da fundamentação científica, enfoques psicológicos desde
perspectivas de origem freudiana, correntes neomarxistas, enfoques humanistas,
personológicos entre muitos outros pontos de vistas.
Segundo o Centro de Referência Educacional –CRE
(2008) entre as décadas dos anos 20 ao 50, a Didática seguiu os postulados da Escola
Nova. Essa forma de ensino buscava superar os postulados da Escola Tradicional,
reformando assim, internamente, a escola. Nessa perspectiva, afirmava-se a
necessidade de partir dos interesses espontâneos e naturais das crianças.
Do estudante passivo ante os conhecimentos a serem
transmitidos pelo professor, passa-se ao "aprender fazendo", onde
cada um se auto-educa ativamente em um processo natural, sustentado por meio
dos interesses concretos dos participantes. A atenção às diferenças individuais
e a utilização de jogos docente-educativos passam a ter um papel de destaque.
Segundo o CRE (2008), a partir dos anos 60 e 70 se
acentuam as críticas a essas perspectivas didáticas. Seu efeito positivo
foi a denúncia da falsa neutralidade pretendida pelo modelo tecnicista,
revelando seus componentes político-sociais e econômicos. A perspectiva
fundamental da prática docente é assumir, por um lado, a multifuncionalidade do
processo de ensino e, por outro lado, a transdisciplinaridade.
Em uma etapa posterior, depois dos anos 80, última
década do século XX e a primeira década deste século XXI, se passou de um
enfoque humanista, sustentado desde a influência psicológica ao enfoque
tecno-científico, centrado nos avanços da própria Didática como ciência
autônoma. Naturalmente, que esses câmbios são diferentes nos distintos países.
Isso depende do grau de desenvolvimento desta ciência em cada pais.
O Enfoque Humanista, centrado no processo
interpessoal e da afetividade, dado pela forte presença de estudos psicológicos
sobre educação, esta sendo substituído pelo Enfoque Tecno-científico que
direciona o processo de ensino, como atividade dinâmico-participativa, como uma
ação intencional, sistêmica, sistematizada que tenta organizar as condições
objetivas e subjetivas que facilitem o processo de aprendência. Portanto, se
começa um trabalho diferenciador entre os objetivos instrutivos e os objetivos
educativos. Não se deve confundir este enfoque próprio da Didática, com um
enfoque Pedagógico conhecido como Tecnicismo, que é outra coisa.
Para ir resumindo, se deve partir de algo
inquestionável, de algo já axiomático por si: a Didática tem seu objeto de
estudo, o ensino. Esse objeto de estudo tem um sistema de categorias gerais que
estão inter-relacionadas entre si pelas leis gerais didáticas. Essas leis deram
lugar aos princípios e corolários que suportam toda a estrutura base desta área
do conhecimento humano. Tem seus próprios métodos de pesquisas que permitem a
produção sistemática de conhecimentos científicos que enriquecem essa estrutura
sistêmica. Portanto, a Didática é uma ciência autônoma e não se constitui em
ramo ou em disciplina de outra em particular.
Diferente da Pedagogia que tem seu reconhecimento
como ciência particular a partir do século XIX, a Didática em muitos países,
ainda não é reconhecida como ciência autônoma. É considerada, erroneamente, uma
disciplina técnica da Pedagogia, ou como ramo desta. Não obstante, felizmente,
são muitas as comunidades científicas que a partir do século XX, deram luz
verde à Didática como ciência particular. Este é um trabalho mancomunado
desenvolvido por muitos. A diferença dos séculos precedentes que se tinha um
didata como referencia numa época determinada, aqui seria muito mais factível
mencionar alguns dos quais fazem a diferencia, como didatas. Aqueles nomes como
Jose Carlos Libâneo, Selma Pimenta, Carlos Alvarez, Ulises Mestre, Homero
Fuentes, entre muitos outros.
Paulo Freire merece comentário aparte. É sem
dúvidas um dos maiores Pedagogo do século XX; mas como aconteceu em outras
épocas, grandes Pedagogos se converterem, também em grades didatas, ou porque
não ao avesso, grandes didatas foram, também, grandes pedagogos.
Considerações finais e importância prática
A Pedagogia, ciência da Educação, nasce no século
XIX e teve seu grande desenvolvimento no século XX. Já a Didática deveu esperar
mais um século; surgiu no final do século XX. Talvez por isso, ainda neste
século XXI, em alguns países, institucionalmente, não é considerada como tal.
Daí, que a Didática não receba o apoio governamental, e seu desenvolvimento
fica comprometido; só a expensas dos trabalhos e esforços individuais de
cientistas didáticos, como o caso do destacado Jose Carlos Libâneo, e o caso de
algumas instituições isoladas.
Por outro lado, é significativo ressaltar que a
Didática, desde sua origem, não estabelece normas, diretrizes, ou quaisquer
outras consideração ao ensino. Ela, como qualquer outra ciência particular,
estuda e pesquisa o objeto dela, e dentro desse objeto, o campo de ação, que
corresponde aos problemas científicos que solucionam através da atividade
investigativa. Logo, o resultado divulgado como um novo conhecimento científico
entrará no processo de interface, para converter esse novo saber, num produto
ou serviço, norma ou diretriz que será aplicado na prática, através dos
processos de introdução e generalização dos resultados científico-tecnológicos.
Esses resultados na prática social provocarão uma inquestionável melhoria ao processo
docente.
Reconhecer as diferenças entre educação e ensino,
possibilitará fazer um melhor planejamento, e de fato, um melhor trabalho
educativo, complementando os objetivos instrutivos das disciplinas com os
objetivos educativos. É "lutar" para que o currículo seja concebido
transdisciplinarmente. É propiciar no planejamento educacional e no
planejamento didático, a possibilidade de ensinar educando e não só educar
ensinando. Para isso, é preciso conhecer a história de cada ciência para não
repetir os mesmos erros de antes.
Como já foi dito em algum outro trabalho nosso, e
para concluir, não deve existir uma unidade forçada entre educação e ensino.
Por isso Haydt, R (1997, p.12) expressa que "enquanto a educação pode se
processar tanto de forma sistemática, como assistemática, o ensino é uma ação
deliberada e organizada" Para que exista educação no processo de ensino se
deve desenhar um currículo que inclua os aspectos educativos desejados. Por
isso, aspectos de cidadania, tais como etiqueta, educação ambiental, educação
no trânsito, ética, moral, legislação, entre muitos outros, devem ser inseridos
no processo docente, desde bem cedo na escola. Portanto, não existe uma
unidade, como lei ou princípio, entre educação e ensino, e si uma "relação
necessária" ao dizer de J. Araújo. (ARAUJO, J. 2002, p. 92). A história da
Didática prova isto.
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